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Diálogo X Monólogo

É fundamental que o casal cultive diálogos francos e abertos sobre suas concordâncias e divergências, sobre suas alegrias e dores, sobre os problemas e suas soluções e sobre o amor que os une.

No entanto, dialogar talvez seja o que menos façamos. Muitos casais, em vez de um diálogo, entregam-se a dois monólogos simultâneos, a um diálogo de surdos.

Na figura da Esfinge, vemos os quatro verbos da iniciação na sabedoria: saber, na sua cabeça de mulher de olhar penetrante; querer, no perfil do laborioso touro; ousar, nas suas garras de leão; e calar, nas suas asas dobradas.

Esses quatro verbos se combinam entre si:

· Saber querer, saber ousar, saber calar.
· Querer saber, querer ousar, querer calar
· Ousar querer, ousar saber, ousar calar.
· Calar saber, calar querer, calar ousar.

Calar é das atitudes mais difíceis e uma das mais importantes para o diálogo. Apenas quando calamos é que verdadeiramente conseguimos escutar o outro. Calar para ouvir, para deixar as palavras do outro repercutirem em nossa mente e em nosso coração.

Estar atento ao que o outro quer dizer. Estar ligado não apenas ao que o outro está dizendo, mas a tudo o que representa para ele aquilo que está falando.

Se o seu companheiro olha para você e diz que está triste, qualquer que seja o motivo, e, por suas próprias dificuldades, não tem coragem de lhe pedir um abraço, um aconchego, você precisa notar essa necessidade.

E conseguirá, se ousar calar-se para entrar em sintonia com ele. Então, saberá se aproximar suavemente, oferecer-lhe o ombro para que ele possa chorar. Do mesmo modo, se o outro estiver irritado e você perceber que há algo errado, algo que no entanto você não sabe definir, em vez de tomar para si as agressões poderá dizer: "Sinto que você tem algum problema. Quero ouvi-lo para poder ajudá-lo".

Nesse momento, você se cala para entender o outro.

Calar para escutar é a busca da sintonia com o outro. O jejum de palavras é também eliminação das palavras dispensáveis e a expressão apenas das que são necessárias a cada momento.

Saber calar é não se esconder atrás de palavras vazias; é estar com a atenção voltada para distinguir o que é real do que é fantasia, o que é fruto da imaginação e o que de fato existe.

Temos a ilusão de que o outro, quando conta o seu problema, espera de nós um conselho. Pode até ser que queira uma opinião, mas o mais importante para ele é ser ouvido, em silêncio e com interesse.

Quando somos ouvidos com atenção, nos sentimos especiais para o outro. E sentir-se especial para alguém é o melhor caminho para uma auto-estima elevada.

Mesmo em situações de tensão, escute. Escutar diminui a tensão gerada por algum conflito, e sem essa tensão torna-se mais fácil chegar a um acordo.

Imagine-se envolvido num conflito com a pessoa amada. Isso poderá ser constrangedor, senão doloroso. Você sente um profundo afeto por ela, mas começou a perceber que está prestes a perdê-la. Hoje você lhe contou seus temores, e a resposta seca que recebeu foi: "Amanhã nós conversamos".

Sua expectativa é imensa...
O que você faria ou pensaria hoje sobre o que vai acontecer amanhã?

Não faça coisa alguma. Ouse calar. Não pense nem pressuponha nada, para não ser tomado por fantasias e assumir uma atitude defensiva que poderá afastá-los ainda mais. Sinta suas emoções e perceba o que a outra pessoa representa para você.

Só depois de saber o que realmente está acontecendo com você é que poderá dizer ou fazer alguma coisa, baseado nos seus sentimentos. Poderá lutar pelo seu amor e, se perdê-lo, vai precisar calar mais uma vez para dar espaço à sua dor e para senti-la. E, depois que ela se esgotar, você precisará calar novamente e se preparar para renovar o seu amor.

Sabe por que muitas pessoas têm dificuldade de conversar com alguém? Porque vivem eternamente em diálogos internos, conversando consigo mesmas, sem perceber que o outro está na sua frente, abrindo o coração.

Muitas vezes as pessoas não percebem as mudanças no outro porque já definiram, dentro de si, o que o outro é, deveria ser ou vai ser.

Não notam que, todos os dias, a pessoa amada muda um pouco. Mas um dia, de repente, descobrem que ela mudou tanto que se tornou impossível agüentá-la e que é preciso ir embora.

Os diálogos internos fazem com que a pessoa defina de antemão o que vai acontecer, impedindo-a de enxergar o que de fato está acontecendo.

Tudo começa com um pensamento, que gera um sentimento e uma conseqüente conduta. Se alguém pensa que o outro não gosta dele, sem nenhum dado real, apenas por uma percepção difusa, poderá cair numa profunda e... inútil tristeza.

Tal sentimento levará a pessoa a se afastar mais e mais de quem ama, conduta que só vai reforçar o pensamento de que o outro não gosta dela. Esse processo é uma retroalimentação permanente do pensamento, que potencializará mais emoções e firmará mais a conduta.

Imaginemos uma moça esperando o novo namorado. Ele prometera chegar às 7 horas da noite. Já eram 9 da noite e ele ainda não tinha chegado. Finalmente apareceu e pediu desculpas, dizendo: "Peço que você me perdoe pelo atraso, mas acho que a sua raiva se deve muito mais a você estar imaginando algo. Se está chateada pelo atraso, tudo bem, mas se for por imaginar que eu estava traindo você, precisamos dar um jeito nisso".

Insistiu então que ela ligasse para o lugar de onde ele tinha vindo, para que confirmasse a razão do atraso. Ela se negou, mas o rapaz foi inflexível: "Ligue para o meu amigo e ele lhe dirá o porquê do meu atraso". Enquanto não se convenceu de que a namorada, ligando ou não, estaria tranqüila, ele continuou a falar, a fim de derrubar a parede que havia surgido entre os dois.

A fantasia negativa pode criar problemas que não existem na realidade, e a única solução é checar a realidade.

Conta-se que uma mulher, no leito de morte, fez o marido jurar que não se comprometeria com nenhuma outra pessoa. E o ameaçou de voltar, como espírito, e de não o deixar viver tranqüilo se ele não cumprisse a promessa.

O marido, a princípio, cumpriu a palavra, mas, depois de alguns meses de viuvez, conheceu outra mulher e se apaixonou por ela.

Quase imediatamente, começou a aparecer-lhe, todas as noites, um espírito que o acusava de haver quebrado o juramento. O fantasma noturno não só estava informado de tudo o que se passava com a relação amorosa que ele mantinha, como também conhecia todos os seus pensamentos, esperanças e sentimentos. Como a situação se fazia insuportável, o homem decidiu pedir conselho a um mestre zen.

"Sua esposa se transformou em espírito e sabe tudo o que você faz, diz e pensa. É um espírito muito sábio e merece ser admirado por você", disse-lhe o mestre. E continuou: "Quando ele aparecer de novo, faça um trato. Diga-lhe que, já que ele sabe tanto de você, não é possível esconder-lhe nada. E, por isso, você vai romper seu novo compromisso amoroso, caso ele responda acertadamente a uma simples pergunta".

"Que pergunta tenho de lhe fazer?", indagou o homem.

"Encha a mão de feijão e pergunte-lhe quantos grãos haverá nela. Se o espírito não responder, você ficará sabendo que ele nada mais é que produto de sua imaginação, e então você não será mais molestado por essas visões."

A noite chegou e o espírito apareceu. O homem agiu exatamente como o mestre mandara. Estendeu a mão e perguntou: "Quantos grãos há aqui?" E não havia mais espírito algum para responder. A imaginação do homem não poderia responder a uma pergunta para a qual nem ele próprio conhecia a resposta...

Agir com base em pressupostos infundados é atirar-se a uma empreitada arriscada.

É importante separar o que é real do que não passa de fruto da nossa imaginação. Apenas o diálogo claro, direto e objetivo nos leva a esclarecer os pontos obscuros.

Quando duas pessoas estão dialogando, a predisposição de ambas é encontrar soluções, trocar informações, estar interessadas uma no assunto da outra, mesmo que o tema seja doloroso. Em geral, dialogar com o outro dói menos do que se imagina.

Roberto T. Shinyashiki

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