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50 ANOS e 4 MESES



Quando abri os olhos me dei conta que fiquei anestesiado durante 10 horas de cirurgia. A remoção de um tumor quase do tamanho de uma bola de pingue-pongue alojado no cérebro não seria fácil, mas nem a equipe médica esperava um tempo tão longo.

Vivi uma vida quase completamente assintomático e o diagnóstico do tumor aconteceu em 2017 por acaso. Só me recordo do momento em que senti a mão em meu ombro e uma voz dizer: "Isso aqui na tela é um tumor no seu cérebro que já pressiona seu tronco cerebral. É grave!". A vista ficou branca, bateu uma tonteira e não ouvia mais nada. Os momentos depois de um diagnóstico tão pesado são terríveis.

Optei pelo sigilo do diagnóstico por algum tempo. O que adiantaria alardear e preocupar mais pessoas?!? 

Dizem que depois da tempestade vem a bonança, mas aquele ano não foi assim. Um temporal atrás do outro. Parecia que estava numa canoa sem remo descendo uma corredeira lotada de pedras. 

Algumas semanas depois do nocaute veio a necessidade de resolver tudo que fosse possível. Entre uma consulta e outra, um prognóstico e outro, encontrava alguém com quem precisava tratar algo, resolvia as pendências da minha vida, me libertava das inutilidades, filtrava meus relacionamentos e juntava o que seria necessário. As viagens se tornaram a terapia perfeita e as pílulas calmantes para não surtar.

Alguns meses sem compartilhar meu diagnóstico com absolutamente ninguém, decidi que continuaria assim. Então, somente às vésperas da operação, compartilhei com meus parentes mais próximos.

A recuperação da cirurgia foi melhor do que o esperado, apesar do tempo de operação e a complexidade. Depois de 5 dias divididos entre CTI e Enfermaria, tive alta. Mas um segundo capítulo ainda me aguardava: Uma infecção hospitalar me internaria por outros 5 dias no CTI e 10 dias na enfermaria com um protocolo de isolamento e medicações pesadas.

Perdi a conta de quantas equipes médicas me avaliaram, punções, exames, medicações intravenosas trocadas a cada hora. Você se dá conta que é um número de prontuário. Parece que é parte de um experimento sobre uma maca. Mas eu sabia que a diferença entre a vida e a morte não estava somente nas mãos de quem cuida de você, mas também numa chave que você liga ou desliga dentro da sua cabeça.

Poderia continuar descrevendo minuciosamente cada dia internado, mas prefiro dizer que passados 3 meses da alta definitiva, hoje, um outro Alexandre assumiu o controle.

Durante toda a preparação para a operação, passei a descartar tudo que não tinha valor: discussões, algemas,  arrependimentos. As preocupações com situações vazias ou aparências. A permanência em estágios da vida que nunca deveriam, sequer, ter atravessado... Me dei conta de tudo que tentei consertar e não tinha conserto. Me dei conta que perdi tempo demais, dando importância demais a coisas que eram pequenas demais.

Depois da alta, a conclusão que chego é que todos deveriam fazer estes questionamentos na vida. Mas avaliando minha situação, posso dizer: Se eu não tivesse um diagnóstico tão devastador, quando pararia para pensar em tudo isso?!? Quando iria dar valor à minha vida?!? Não acho que todos devam passar por algo tão traumático assim, mas acredito que as pessoas se deparam com gatilhos que as levam a este estágio mais adulto da vida. Basta ter atenção.

Talvez o segredo de um ano novo de verdade seja abrir mão de tudo que você não precisa e acabou se apegando no ano velho - a regra vale para pessoas ou coisas.

A conclusão é óbvia: Reclamar é clamar duas vezes. Se reclamo da dor,  trago-a  para um pouco mais perto de mim. Se reclamo das circunstâncias ruins, escolho caminhar um pouco mais  com elas. Se reclamo de alguém, dou involuntariamente meu tempo para essa pessoa.

O remédio pra tudo isso? Abrir mão e ser grato!
Tá machucando? Larga! Tira sua paz? Solta!
Não suba na vida pisando ou se aproveitando de ninguém. Ajude, cuide, dedique tempo, invista. Mas faça questão de manter por perto só o que te faz bem e escolha a gratidão como estilo de vida.

A equipe médica, baseada nos últimos exames, diz que nada mais resta do tumor, nem a possibilidade de regresso. Então, escolho agradecer esse tempo que me propiciou a habilidade de olhar para dentro de mim, jogar fora meus pesos, recarregar minhas forças com tudo de bom que tenho e mudar meu olhar daqui por diante.

Pensei muito antes de vir aqui compartilhar tudo isso, ainda considero muita exposição. Mas queria que minha história servisse de estímulo para que outros vençam seus desafios: Abrir mão do que faz mal, e quem sabe, vencer uma depressão. Eu sei, às vezes a gente têm muitos motivos pra desistir, mas sei também que precisamos de um único para insistir, persistir e lutar. 

Existe uma vida nova pronta para você lá fora, basta você acreditar e fazer as escolhas corretas hoje. Não vá pelo caminho mais fácil, não abra mão do seu caráter ou pise nos outros. Você vai alcançar seus objetivos!

No final das contas dirão que você teve sorte, mas você lembrará os sacrifícios que fez e o quanto orou. Homem nenhum terá mérito pelo que você conquistou!

Neste post, a foto foi dividida em dois momentos: o pôr-do-sol da janela do meu quarto no hospital. A segunda, do milagre de estar vivo aqui contemplando o mar que tanto amo.

Comemoro hoje 50 anos de idade natural e 4 meses de idade sobrenatural concedida por um Deus que cuida de cada detalhe da minha vida.

O meu presente já recebi: Minha vida! Sigo agora na minha luta pela recuperação. Então, feliz aniversário pra mim! E muitos aniversários felizes para você que leu essas sinceras linhas.

Obrigado, SENHOR!


Alexandre Barreto


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Comments

  1. Q história linda de vida e superação,só quem passou ou teve uma pessoa que ama sabe o que suas palavras realmente significam,a dor,a angustia,o medo,posso apenas imaginar o que sentiu, não esperava por isso,mas a vida é uma caixinha de surpresas e a melhor surpresa é saber que esta curado e tudo passou graças a Deus por isso e issa só me faz te admirar ainda mais!

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