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Café


Eu realmente quis muito tomar um café contigo naquela manhã nublada. Esperei ansiosamente depois de dias sem poder te tocar com as minhas mãos. Te ouvia com o coração e era realmente maravilhoso, mas meus olhos precisavam esbarrar na sua silhueta, para que minha mente parasse de me encher o saco insistindo em dizer que você não existia.

Sim, você existiu delicada entrando naquele café. Foi a primeira vez que vi um Girassol. Você não conseguiu perceber, mas seus passos, que flutuavam a uma altura considerável do chão, tinham uma trilha sonora. Soava uma música que, arrisco dizer, era entoada por anjos. Foram poucos segundos para que minha mente se envergonhasse da sua existência e meu coração desferisse alguns socos dentro do meu peito enquanto gritava: "Eu não disse?!?".

Quando você chegou, não me lembro de estar sentado, em pé, ainda no Café, ou nem ao menos meu nome ou o significado da minha vida sem o teu sorriso. Foi um momento bem incomum, confesso. Mas o que esperar de você?!?

Saímos do Café sem café. Fomos em direção a um lugar que nunca tinha visto antes em toda minha vida. Deve ser algo depois do Espaço Sideral, ao lado da Via Láctea, talvez um planeta plano. E nem sei como tive tanto combustível no carro pra chegar tão longe sem ter saído do lugar.

"Parei!", gritei pra mim mesmo. "Agora preciso analisar com a razão...". Tentei. Tentei mesmo. Mas o que a razão viu foi 3.859 vezes melhor do que aquilo que a emoção percebeu. Você era gentil na entrada e na saída. Seus olhos sussurravam toda vez que falavam comigo - e como eram tagarelas! Teu sorriso iluminava meus dias à distância, eles refletiam em mim, grudavam na minha pele e seguiam comigo. Seu toque era uma música suave que levantava com um sincronismo lindo cada pelo do meu corpo. A razão acabou comigo, confesso. Você era um Girassol apontado para a minha felicidade.

"Preciso de um plano.", disse ingenuamente. Mal sabia que você não cabia em um plano elaborado pela minha limitada mente. Você não pertence a parte alguma da melhor estratégia. Impossível tentar te inserir num programa de curto, médio ou longo prazo. Você é o próprio Tempo.

Sim, você ao meu lado controlava o passar das horas, minutos e segundos. Tinha o incrível poder de congelar instantes e mantê-los pela eternidade dentro de mim. Sua voz percorria toda minha essência como um eco da mais linda palavra que jamais alguém ousou dizer, justamente, porque ela não foi inventada ainda. Você é a deusa Chronos, que tive a audácia de conhecer - e me envolver.

E foi na limitação de lidar com meu fascínio, que tentei adoçar o nosso café. Mal sabia que a melhor forma de sentir algo é provando somente sua essência, nua e crua, sem aditivos ou complementos, sem adoçante ou açúcar. Era exatamente assim que eu deveria ter mergulhado em você: Naquele doce, profundo, negro e amargo café!

Adoçar você foi tentar te encaixar na minha vida te arrastando pelos braços. Foi movimentar meu carro de ré até o ponto em que você entrou pela porta. Foi ver você voltando de costas e não me encontrando em nosso primeiro café...

Te adocei com a esperança de mudar a sua essência pra encaixá-la na minha e foi ali que você deixou de ser a minha bebida mais forte que me fez voar e se transformou em um evento cotidiano que me mantém acordado por algumas poucas horas.

Que não existam outros "Eus" que tentem te adoçar. Você foi feita pra ser sentida quente, forte, marcante e levemente amarga.

Os melhores cafés são assim. A melhor mulher que conheci na vida é assim também: Você.


Alexandre Barreto


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