A vida é simples, a despeito do que falam muitos. Tudo que precisamos é saúde e amor. A saúde é um presente e nos cabe dela cuidar no dia a dia. O amor é um presente e nos cabe dele zelar com as mãos de um jardineiro.
O amor nasce sem que ninguém plante, como as mais belas orquídeas nas florestas. Os encontros de dois estranhos metaforizam o encontro da semente adormecida no solo fértil e do sol que alimenta de luz a vida que nasce. Brota simplesmente. Por vezes, A mão de eventuais jardineiros amigos interfere para que esse encontro aconteça.
A flor, quando brota, busca o sol. Ela precisa de luz. Ela aposta na luz. Tem dificuldade de romper o broto e desafiar suas próprias raízes em busca de novos caminhos para seu caule e suas douradas pétalas. Vez por outra, no início, não consegue ver o sol de primeira, pois as copas das árvores a querem iludir dizendo que não há sol, que não há essa luz que busca, que é uma busca vã. Mas teimosamente, e por crer na luz, a flor desafia suas forças, estica seu caule, distancia-se da sua raiz. E vai à busca dquilo que sabe que existe.
A luz, por sua vez, tem como missão iluminar a flor. Atravessar a copa das árvores em lâminas finas de energia para cumprir a determinação divina. E insiste também em rasgar o manto verde em busca do solo abaixo para que possa tocar, com seus lábios, a flor que anseia por seu beijo.
O encontro da luz com a flor aconteceu. Embora cansados, a luz e a flor ainda acreditavam no desígnio do encontro. A flor encheu-se de felicidade por cumprir sua missão de ser flor: bela, encantadora, cheirosa, flor. A luz encheu-se de esplendor por saber-se útil nos planos de Deus: a luz ainda aquecia, a luz ainda aconchegava. A luz ainda era luz.
A flor foi crescendo e afastando-se de sua raiz. Sempre, eternamente e ternamente ligada à sua raiz, mas distante dela para viver a felicidade de ser flor. A luz, revigorada pela beleza e pelo sorriso que a flor lhe ofertava diariamente, viu-se apaixonada. Com nunca estivera.
A flor virou árvore frondosa. Aproximou-se cada vez mais da luz e, cada vez mais, era luz pelo brilho inegável das pétalas da flor, agora folhas da árvore. E eis que, em um novo presente de Deus, maravilhado com suas criaturas, surgiram novos brotos de flor. Esses brotos de flor, frutos do amor da flor em ser flor em buscar cada vez mais sua floritude, frutificaram. Frutos de amor. Frutos do amor eternos, desenhados desde sempre por sua suprema sabedoria. Filhas da luz e da flor: flores iluminadas.
Tu és a minha flor. Longe das raízes. Bela, bonita, forte. Teu caule sustenta a minha existência. Tuas folhas refrescam-me do calor que às vezes emano em demasiado pelo correr do dia a dia. Teus galhos acolhem-me nos meus dias mais frágeis e mais cansados, como os galhos acolhem o lar de um joão-de-barro ou o ninho do uirapuru.
Quero ser tua luz. Aquela que veio de longe para te conhecer. Aquela que veio de longe pra te iluminar. Te fazer crescer. Te fazer dar frutos. Vem em quando, estou escondido por de trás das copa das árvores da floresta do cotidiano. Mas estou lá. Sempre estive. Sempre estarei. Porque eu sou tua luz. Porque tu és minha flor.
A vida é simples a despeito do que muitos falam. Basta uma flor, basta uma luz, basta um encontro de amor. O resto, a providência faz acontecer. E quero que tu saibas que cada lampejo que da minha luz vier será para iluminar a ti e ao nosso belo jardim. Porque não te colocaste na minha vida e eu não me coloquei na tua à toa. Foi pra tu me perfumares minha alma. Foi pra eu te iluminar o coração. Eu te amo, minha flor. E te quero do meu lado até minha luz apagar de tanto amar. De tanto te amar.
Sérgio Freire
* Para a Bia, antecipando o 12 de junho
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