Fui almoçar num restaurante simples. Olhei e vi na mesa um adoçante. De repente me dei conta da onipresença do discurso light. São revistas falando em ser esbelto, clínicas lotadas de gente para lipoaspirar. A sociedade conspira a favor da magreza.
Havia na mesa ao lado um casal. Ele, vermelho de raiva. Ela, azul de fome. Haviam chegado há algum tempo e nada da comida. A cada minuto, o vermelho espumava e reclamava por causa da demora de sua carne. Teve uma hora que se zangou e mandou cancelar tudo e trazer a conta, xingando a garçonete. De repente, a carne chegou. Ele reclamou que já não era sem tempo. Depois, reclamou porque foi servida numa tábua. Por fim, reclamou porque estava mal passada. Tudo em num showzinho ridículo. Foi aí que eu fiz a conexão: tem suco light, maionese light, chocolate light. Mas não vejo ninguém fazendo a mesma pressão para generalizar outro tipo de dieta igualmente necessária: a pessoa light.
Muitos fazem tudo para ser magro. Poucos se esforçam para ser leve. Tem fininho de 45 quilos que é um chumbo de grosso. Essas pessoas vivem se queixando da perseguição contra elas. Nessa reclamação, nem se dão conta de sua arrogância e prepotência. Têm certeza que o universo gravita em torno de seu umbigo. Não perdem a chance de ser maldosas, com piadinhas e fofocas sobre os outros. Não conseguem ver graça em nada, não relevam as chatices comuns do dia-a-dia, levam tudo muito a sério. Igual ao cara vermelho da mesa ao lado. Os pesos pesados de alma patrulham os outros nos seus gostos e ações, censuram tudo e todos. Eles são pesados porque carregam as dores do mundo nas costas. São da pesada.
Como se já não bastasse a violência, a fome, a miséria, o calor e o Sabino eleito, ainda temos que ouvir a rudeza de gente como o cara vermelho da mesa ao lado. Gente sem a menor vocação para o sorriso. Levar a vida na boa é algo sem serventia para as almas pesadas. Perguntam como é que alguém pode achar prazer em coisas sérias como o trabalho e a família. Não compreendem como é que se vive sem criar problemas, sem armar barracos e sem gritar com quem lhe presta serviço, quem sabe menos ou quem pode menos. É, porque os pesos pesados de alma são covardes. Só se metem com os mais fracos, mas se borram diante do chefe.
Proponho uma campanha: a do selo pessoa light. Nossa seriedade não se perde se formos mais bem-humorados, se nossos espíritos andarem desarmados. Respeitabilidade e leveza combinam, a despeito do que pensam os obesos de alma. Precisamos exercitar o agir com leveza, sem sofrer com a vida, e ter mais jogo de cintura, de respeito ao próximo. Se nós não deixarmos para sofrer por aquilo que é mesmo trágico e passarmos a vida se maldizendo por causa dos pequenos incômodos cotidianos fica impraticável viver em sociedade.
Todos nós passamos nossos baixos: dor de amor, carteira vazia, angústia existencial. Daí soterrar os outros com seu peso particular já é demais. Segure as pontas e emagreça onde precisa emagrecer: na alma, no espírito, no humor. O mundo fica horrível cheio de homens vermelhos reclamando da carne na mesa ao lado.
Sérgio Freire
Muito bom.
ReplyDeleteA dieta da alma: Reduzir a zanga, a discussão inútil, a reclamação exagerada, o perfeccionismo para com os outros, ...
Mas este artigo não teria sido feito se não houvesse estes gordos da alma. Eles nos ensinam como é ser do jeito que são para que os que já estão em um nível de percepção avançado consigam aprender que este comportamento não cabe mais nos dias atuais. Estes gordos da alma ainda tem um caminho maior a percorrer que os que já tem consciência desta situação. Pratiquemos nós a leveza da alma, principalmente próximo a estas pessoas, para que elas vejam com os próprios olhos que é possível resolver os problemas de uma maneira mais leve: Pedir desculpa quando tiver errado; dizer que é uma questão de ponto de vista; se todos forem para o mesmo lado, o barco afunda,... Estas pessoas testam inconscientemente nossa visão light da vida... Será que conseguimos viver de maneira light com estas pessoas? ou só sabemos viver light com pessoas light???
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