Insistiu em procurar o mesmo lápis com que escrevera durante todos esses anos. Já estava acostumado com sua forma e nem percebia que fazia tudo religiosamente.
Queria registrar novamente sentimentos frios e nem se dava conta de seus vícios.
Como um operário na linha de montagem, não percebia nada ao seu redor. Preocupava-se com seu pequeno e obtuso mundo que resumia-se a uma restrita brecha de visão.
Buscou os papéis e prosseguiu em sua missão. Parecia seguir um ritual fatídico sem se dar conta. Qualquer pessoa mais isenta poderia lhe dizer que aquilo de nada valia. Mas ele cercava-se também da rotina que o apoiava incondicionalmente.
Estranhamente percebeu que do meio das folhas caiu um papel carbono. Naquele dia em especial, teve sua atenção voltada para aquela negra folha com visíveis falhas entre as partes destinadas ao uso.
O pegou com gentileza e observou minuciosamente. Viu ali registrados capítulos de sua vida. Frases incompletas. Promessas nunca cumpridas... Algumas tão repetidas que pareciam exercícios caligráficos.
Neste momento parou e olhou para nada acima de si mesmo. Um frio percorreu-lhe todo o corpo e só então percebeu:
Usava tudo aquilo para escrever as páginas de sua vida!
O lápis era de outra pessoa. As folhas, restos reaproveitados de alguém em forma de conselhos. O carbono, a mais pura representação da rotina...
O lápis era de outra pessoa. As folhas, restos reaproveitados de alguém em forma de conselhos. O carbono, a mais pura representação da rotina...
Não importando-se para o que havia escrito no passado, teve uma atitude radical. Tirou do bolso um guardanapo que havia sobrado do rápido almoço, comprou uma caneta nova e com a insensatez de um adolescente, rabiscou:
Começo a caminhar, percebo minhas batidas, registro minhas próprias imagens. Me perdoe, mas deste ponto em diante sigo só.
Alexandre Barreto
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