"Devolver uma pessoa a ela mesma é ensinar-lhe um jeito de expulsar o que é ruim e ajudá-la a cultivar aquilo que é bom."
Eu creio que nós, como evangelizadores, temos de eleger os temas que acreditamos ser pertinentes dentro do contexto da evangelização. O Evangelho abrange toda a nossa vida, tudo aquilo que somos como pessoa; por isso é importante que descubramos como é que construímos as nossas relações e como estabelecemos os nossos relacionamentos. Uma vez que nós queremos conversão – e isso significa entrar na dinâmica do processo de Deus em nós – precisamos analisar aquilo que é fraco em nós.
O meu desejo de escrever algo que falasse sobre isso era, justamente, traduzir um pouco daquilo que (eu creio) seja urgente dentro do contexto da evangelização. Nós precisamos traduzir de maneira muito humana, muito concreta o que significa ser de Deus. Assumir essa condição de pessoa, essa postura, esse jeito de ser gente, buscando a inteireza o tempo todo é, sem dúvida, viver o processo de santidade. É uma tradução muito atual daquilo que chamamos de santidade.
Tenho muito medo das pessoas que geram opinião pública. A mídia funciona muito com essas aparições meteóricas de pessoas que, porque ficaram trancafiadas dentro de um reality show – e ganharam [o prêmio] – tornam-se celebridades e têm sempre alguma coisa a dizer, mesmo que não estejam preparadas para isso. Essas pessoas geram comportamentos, atitudes. Isso é muito preocupante, porque quando temos uma cultura nivelada em celebridades, que não têm o que dizer, acabamos nos "nivelando por baixo" também.
Como é possível que alguém nos roube de nós mesmos?
É muito fácil que alguém nos roube de nós mesmos, porque cada vez que nós somos influenciados – e existe uma força para levar de nós aquilo que temos de mais precioso, que é a nossa liberdade – então, já estamos sendo roubados. Cada vez que você percebe que tem de deixar de ser você mesmo para estar num grupo, quando percebe que a sua vontade está fragilizada ou que o outro tem um acesso inescrupuloso às suas decisões, você está sendo roubado. O seqüestro da subjetividade é muito comum; ele acontece nos mais diversos meios, nas mais diversas situações e até mesmo em inusitados encontros corremos o risco de ser roubados, de perder a inteireza.
Eu me sinto na necessidade de devolver alguma coisa para ele. Mesmo que eu não tenha o dom de devolver tudo o que ele perdeu, sempre trabalho na perspectiva de uma palavra boa. Quando uma palavra positiva substitui uma negativa, ela tem o poder de refazer quem a escuta. Muitas vezes, somos escravos das idéias ruins, das más lembranças e tudo isso é roubo. Quando eu permito que uma lembrança ruim tome conta de mim a ponto de gerar uma atitude, uma postura ou um jeito de ser, estou, naturalmente, perdendo o meu valor como pessoa, porque eu acabo ficando à margem daquilo que eu poderia ser.
Creio que seja a diferença do tema, pois este vai inaugurar – e até mesmo fomentar – outros escritos nessa linha, de uma teologia aplicada. Na verdade, o livro nasceu da minha experiência como professor de Antropologia Teológica. O conceito de pessoa, que é o subtítulo da obra, é muito rico dentro do conceito de Teologia, que, aplicada, parece um pouco com Psicologia, porque quando você fala de Deus, fala de realidade humana.
Na verdade, o tema de “Quem me roubou de mim” é muito pretensioso, muito vasto e é muito difícil trazermos uma obra para o público que possa explicitar a grandeza desse assunto. O seqüestro da subjetividade é um assunto que aborda muitas formas de relações humanas, por isso eu me ative a algumas apenas. Não tive condições de condensar tudo isso num conteúdo só; acredito que possa haver desdobramentos e que, deste livro, possam nascer outros. Nele, nós tratamos um pouco da relação marido-mulher, namorados, amigos; um pouco da relação pai e filho, mas o seqüestro da subjetividade é muito mais do que isso.
A qualquer pessoa que, de alguma forma, já foi roubada de si mesma e que tem o desejo de resgatar-se, de sair dos cativeiros. É muito simples entrarmos nos cativeiros dos afetos. Isso acontece quando percebemos que alguém começou a mandar em nós, que nossa alegria ou tristeza está dependendo dele e que, infelizmente, perdemos o comando da situação. É um livro para todos aqueles que já experimentaram isso. Acredito que todos já passaram por alguma experiência de seqüestro da subjetividade, mesmo que não tenham consciência disso. Quem sabe se você, na hora em que o ler, descubra a verdade.
É interessante porque todas elas foram contadas com muito sofrimento. Uma das características que eu observo no relato do povo, na tradução mais sincera da dor que sente, é que realmente as pessoas – que vivem essa experiência de seqüestro – sofrem muito. Mas esse sofrimento não é o suficiente para haver a melhora. Muitas vezes, elas não sabem sair do sofrimento (que tem). As histórias passam por gente muito concreta; o livro é todo muito concreto.
O meu trecho favorito do livro é a parte do mito do amor romântico, porque é um tema que eu gosto de estudar; gosto da influência dos mitos na sociedade; trabalhei muito isso como professor de Hermenêutica. O mito do amor romântico fragiliza muito as relações humanas, porque ele nos coloca – claro, é um imaginário coletivo que chegou até nós – na esperança de que a vida, as pessoas e as relações sejam perfeitas.
É interessante porque quando nós temos a experiência da "poda", ela nos parece muito doída, mas sabemos o quanto ela é necessária quando a árvore do vizinho cresceu do nosso lado. Porém, quando ela está no nosso quintal, ultrapassando para o território do vizinho, talvez não sintamos tanta necessidade dela [poda]. É justamente disso de que nós falamos o tempo todo, porque quando a vida do outro "cresce" demais "para o nosso lado" e nós permitimos, corremos o risco de que a nossa vida fique sufocada pela do outro. Mas não pode ser assim. A vida tem de ser, o tempo todo, experiência de equilíbrio. O casamento só pode dar certo à medida que as partes se respeitam e se complementam. Uma relação de amizade só pode dar certo quando mantemos os espaços estabelecidos. Mesmo que vez ou outra eu convide você para entrar neste "território", não significa que, a partir do momento em que você entrou pela primeira vez, que ele é de livre acesso. Preservar a sacralidade do outro é um elemento essencial para que as nossas relações sejam saudáveis. Espero que eu tenha ajudado você a viver e a estabelecer melhor as suas relações humanas. Deus o abençoe. Um grande abraço. Desejo que ninguém o roube nesta vida.
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